Você Pode Ir Na Janela

soft encounter

Luke
Ele estava olhando para mim. Aqueles olhos estavam olhando diretamente para os meus. Por que ele foi embora daquele jeito? Será que ele já havia me visto antes? Será que todo o meu cuidado para permanecer invisível atrás das cortinas não foi o bastante? Estúpido. Agora quem sofre com as conseqüências dessa idiotice toda são os meus pulmões, já tendo que agüentar o terceiro cigarro. Mas do que adiantaria conservá-los se o órgão mais importante, meu coração, parece não estar mais funcionando?
- Droga.

Paul
Do que eu tenho medo? O que demais poderia acontecer se eu falasse com ele? Todas aquelas fantasias amorosas em que eu ficava pensando eternamente como um adolescente com os hormônios em desordem iriam ser quebrados em incontáveis pedacinhos e espalhados pelas ruas até serem tragicamente levados pela água da chuva para acabarem dentro de um esgoto mal cheiroso, mas eu acho que conseguiria viver com o trauma. Talvez até o superasse... Ou talvez não. Maldito coração. E maldita seja a corretora que me colocou naquele apartamento. Sim, ela é a culpada de tudo. Aquela vadia. Droga, a quem estou querendo enganar? Sou eu o culpado de toda essa desordem. E eu poderia ter terminado com tudo isso simplesmente indo até ele no balcão e contado toda essa patética história para levar logo uma boa risada na cara, voltar para casa e finalmente conseguir dormir, sem ficar imaginando como seria se eu o conhecesse. Mas não, este sou eu, sempre estragando as melhores oportunidades. Agora já é quase uma da manhã e aqui está você, sozinho, numa noite fria, entrando em um beco sem saída para refletir e aprimorar sua solidão. Mas veja! Você não está sozinho. Há um fumante aqui também. Oh céus, você só pode estar brincando. É ele. É ele...

Luke
Será que nem nos fundos do meu próprio local de trabalho eu posso ter um pouco de privacidade? Mas quem...
- Oh céus. V-você...
- Ah... Desculpe-me, eu pensei que não houvesse ninguém aqui e... – Ele disse, parecendo envergonhado, com os braços cruzados, tentando espantar o frio da noite e as mãos tremendo incontrolavelmente.

Paul
- Não, por favor! Fique aqui, eu... Eu não me importo. – Ele disse, dando um suave sorriso e jogando seu cigarro em um canto. – Você... Você mora no prédio da esquina, não é?
- Bem, se você quer chamá-lo assim... Eu prefiro o termo barraco. – O que você está fazendo, Paul? Conte tudo logo para ele! Agora!
- Não, eu não diria isso sem conhecer o prédio da frente. O meu prédio. – Ele respondeu, rindo docemente. – Sabe, eu... Eu não quero te assustar. Na verdade eu não faria isso em sã consciência, mas aquele foi meu terceiro cigarro e esta pode ser a única vez que eu poderei te ver assim, sem ninguém então... Por favor, apenas me escute. – Ele disse em um tom sério e ligeiramente melancólico, se aproximando e encostando uma sua mão quente e macia em meu braço, enquanto milhares de coisas passavam pela minha cabeça e sentia que iria ter múltiplos ataques do coração ali mesmo. – Eu não sei seu nome. Não sei sua idade, nem sei ao certo aonde você trabalha. Mas todas essas coisas são apenas detalhes. A verdade é que desde que você se mudou para aquele apartamento, desde a primeira vez que você apareceu naquela janela, a única coisa que passa pela minha cabeça é o quanto eu gostaria de estar ao seu lado. Isso é loucura, eu sei, mas... Eu acho que eu te amo. Não, cacete, que besteira. Desculpe. Eu não acho, eu tenho certeza... Eu te amo.
- É loucura.
- Me desculpe... É melhor eu entrar e voltar a trabalhar, por favor, esqueça tudo o que eu disse... – Ele disse, virando-se, tentando esconder as lágrimas que estavam prestes a transbordar de seus olhos.

Luke
- É simplesmente loucura que tudo o que você acaba de me dizer foi exatamente como eu me senti quando te vi. – Ele disse, segurando minha mão delicadamente, aproximando seus lábios de meu rosto. Tão próximo que eu podia sentir sua respiração quente e ofegante batendo contra o meu rosto. – Eu também não faço a mínia idéia de quem você seja. Mas o simples fato de você me fazer ficar a noite inteira observando cada gesto seu, noite após noite, já é o bastante para me fazer dizer que eu te amo e estou apaixonado por você sem medo de não estar certo o que estou dizendo.
Cada palavra, cada letra pronunciada por aqueles lábios faziam meu corpo se arrepiar e transpirar de felicidade, como nunca havia feito antes. Me parece que eu estava errado. Eu nunca fui simplesmente uma sombra. E agora ele sabe que também sempre foi muito mais do que isso.
A luz da lua e das milhares de estrelas se refletiam sobre nós quando ele colocou sua mão fria em meu rosto, se aproximando a cada milésimo de segundo que parecia durar uma eternidade, até que finalmente seus lábios cálidos e macios se encontraram com os meus, e assim se deu início ao beijo que tanto sonhava e desejava, dia e noite.

Paul
Eu não poderia desejar mais nada naquele momento. Eu tinha a Lua em meus braços. E a Lua me tinha nos seus. Era tão magnífico que nem as estrelas pareciam estar tão distantes.
- Aliás, eu me chamo Luke.
- Paul. Paul Cioran.
- Paul... Eu te amo, Paul. – Ele disse, fechando os olhos e descansando delicadamente sua cabeça em meu ombro.

Luke
- Eu te amo, Luke. – Ele disse, com um sorriso.