As memórias de Nessa

- Oh mas tu estás apaixonada! Como é que não percebi… esse olhar não engana ninguém! – disse o Luke e desmanchou-se em gargalhadas.

- Não te interessa – Olhei então para o relógio – Oh, estamos atrasados, despacha-te rápido ou vamos chegar tarde ás aulas e hoje eu não posso mesmo chegar tarde!

- Porquê? – perguntou-me o Luke enquanto calçava os seus ténis mais confortáveis.

- Porque pelos vistos vamos ter um aluno novo. Acho que veio cá de férias uma vez e adorou o sítio e agora vem para cá estudar, pelo menos foi o que a senhora Norris nos disse.

A senhora Norris era a minha directora de turma. Era muito alta e a alcunha que alguns colegas meus lhe davam era “Torre” mas eu não gostava nada deste tipo de alcunhas pois achava estúpidas. Não devia ter menos de cinquenta anos pois o seu cabelo grisalho e as suas rugas vincavam-lhe bem a cara. Tinha uns olhos verdes claros e estes faziam-na parecer triste por vezes.

Eu e o Luke saímos de casa a correr para conseguirmos chegar a tempo á escola que ainda se encontrava a cerca de dez minutos a pé de nossa casa. Quando lá chegámos faltava apenas três minutos para o toque por isso não houve tempo para grandes conversas logo, apenas nos despedimos e cada um de nós foi para a sua sala respectiva.

A minha sala estava igualzinha a todos os outros dias, alunos sentados, alunos em pé que conversavam energeticamente uns com os outros. O meu olhar procurou o Nate e encontrou-o no final da sala, sentado numa cadeira sozinho a olhar fixamente na minha direcção. Caminhei para ele e os cantos da sua boca elevaram-se para me mostrarem um pequeno sorriso de bom-dia. A minha boca reagiu como se estivesse do outro lado de um espelho e senti os cantos dos lábios elevarem-se para ele também. Estava a caminhar e nem dei noção da confusão que estava ao meu lado e apenas notei o que estava a acontecer quando cheguei perto do Nate e este me disse.

- É o rapaz novo, está toda a gente exaltada por haver carne fresca na turma e, pelo que já ouvi muitas raparigas dizerem, ele é muito giro, se te quiseres juntar a elas força.

- Oh Nate conheces-me, sabes como eu sou. Nunca me juntaria a essa gente doida que se apaixona pelo primeiro rapaz giro que lhes aparece á frente, isso é algo realmente fútil. Para se gostar de alguém há que conhecer bem essa pessoa e depois é deixar o coração abrir-se para essa pessoa.

- Uau, alguém acordou inspirada hoje! O que foi desta vez? O que aconteceu?

- Nada de especial, apenas descobri que o meu irmão tem uma namorada e anda-se a escapar durante a noite para ir fazer “certas coisas” com ela, se é que me entendes. Isto deixou-me a pensar como é o amor e pronto, estou poética, não há nada a fazer.

- O teu irmão? Calma… o Luke anda a fazer isso? – Nisto desmanchou-se a rir e pôs-me a rir também pois o riso do Nate é contagiante. Quando dei conta estava a turma toda a olhar para nós que nos ríamos desalmadamente num cantinho da sala de aula. Não tardou muito para que as suas atenções se voltassem de novo para o rapaz novo, que eu ainda não tinha tido oportunidade de ver.

Tocou o famoso toque irritante da campainha que nos avisava que a professora estaria a chegar a qualquer momento e o aluno novo dirigiu-se á saída da sala nunca virando a cara, logo, tudo o que eu tinha conseguido ver é que era alto e tinha cabelos castanhos muito claros, quase loiros. Dirigi-me ao meu lugar, que eu adorava muito pois era junto á janela, na última fila. Conseguia ver lá para fora e isso era algo que me encantava e me acalmava imenso quando era tempo de exames e conseguia divagar um pouco nas aulas sem que as professoras percebessem.

Hoje o céu não estava limpo de todo, estava coberto por nuvens de cor cinzento-escuro por isso percebi logo que dentro de pouco tempo iria rebentar uma tempestade, e não ia ser pequena. Senti um arrepio que me atravessou todo o corpo, a natureza parecia estar a avisar-me de que algo estava errado, de que algo de mau se ia passar e me ia afectar.

A professora entrou na aula com um grande sorriso na cara. Com os meus sentidos apurados consegui perceber que no dia anterior o marido lhe tinha feito uma surpresa qualquer como levá-la a jantar fora ou então oferecer-lhe uma viagem que ela só faria com ele.

- Bom dia turma. Como ontem já vos disse, vocês vão ter um novo colega aqui na turma. Ele veio de Londres por isso não conhece mesmo ninguém, espero que o recebam bem e que o façam sentir que está dentro da turma, eu sei que vocês são bons a fazer isso. – Olhou para o meio da multidão que se tinha instalado na sala.

Quando ele se virou eu não queria acreditar no que estava a ver á minha frente e, desastrada como sou, sem querer deixei cair o meu estojo ao chão espalhando tudo e fazendo um barulho tremendo, barulho tal que foi abafado por um trovão forte que soou na rua, seguido por gritos de algumas raparigas que temiam trovoadas. Estava tudo uma grande confusão.

- Este é o Henry.

Ele virou-se para enfrentar toda a turma e com uma voz serena e calma disse:

- É um prazer conhecer-vos a todos, espero que nos demos todos bem.